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advogados | opinião

A sustentabilidade financeira dos contratos públicos na instabilidade destes tempos

José Luís Esquível, advogado





O tempo que estamos a atravessar, marcado pelos efeitos da pandemia de covid-19, assim como pelas consequências da crise energética, da guerra na Ucrânia, da inflação e do aumento substancial dos custos das matérias-primas, está a ter um impacto material muito significativo no equilíbrio financeiro dos contratos públicos em vigor. Este impacto projeta-se, de um modo geral, em qualquer contrato público, seja qual for o seu objeto, na medida em que quer a realização de uma obra quer a prestação de um serviço ou o fornecimento de um bem são afetados pelas atuais circunstâncias económicas.

A atividade dos mercados públicos, se, por um lado, é essencial para a concretização do interesse público subjacente à celebração de cada contrato público, por outro assume grande importância para a sustentabilidade de muitas empresas, cuja atividade, em dimensão variável, está ligada a tais mercados.

Consciente da presente situação, o Governo aprovou um regime excecional e temporário no âmbito do aumento dos preços com impacto em contratos públicos, consubstanciado no Decreto-Lei n.º 36/2022, de 20 de maio (DL 36/2022). O âmbito de aplicação deste diploma abrange quer os contratos em execução, quer os contratos a celebrar, quer ainda os procedimentos de formação de contratos públicos iniciados a iniciar. Tendo o DL 36/2022 sido preparado primordialmente para fazer face aos aumentos de preço dos custos das matérias-primas, materiais e mão de obra no campo das empreitadas de obras públicas, o legislador pretendeu também, com as devidas adaptações, aplicar o mesmo aos contratos públicos de aquisição de bens, de aquisição de serviços e aos que, independentemente da natureza jurídica do dono da obra, estejam sujeitos a regras de contratação pública.

Importa, no presente momento económico, assegurar o equilíbrio financeiro dos contratos públicos, pois apenas por esta via os operadores económicos que contratam com a Administração Pública terão condições para garantir o respetivo cumprimento. Para que tal aconteça é necessário estarem reunidas, pelo menos, três condições objetivas: (i) haver dinheiro; (ii) haver procedimentos adequados de reposição do equilíbrio financeiro (de que a revisão de preços é apenas uma das modalidades possíveis), e (iii) haver celeridade na concretização da reposição do equilíbrio financeiro.

Se a iniciativa legislativa subjacente ao DL 36/2022 é louvável, é essencial operacionalizar o que falta para que a finalidade deste diploma seja exequível em tempo útil relativamente ao leque de contratos que o mesmo abrange e, a este respeito, designadamente no que se refere aos contratos públicos de prestação de serviços é ainda necessária uma intervenção do Governo para que tal efeito seja atingido. Existem hoje centenas de empresas em dificuldades, designadamente de tesouraria, que necessitam de ver assegurado com urgência o equilíbrio financeiro dos seus contratos públicos, pelo que é imperioso que sejam implementadas as condições e os mecanismos que permitam concretizar esse equilíbrio.

Com efeito, importa ter presente que atualmente a contratação pública nos diversos sectores de atividade económica (obras, saúde, ambiente, transportes, entre outros) está marcada por contratos financeiramente muito apertados para os operadores económicos, em resultado do mecanismo do preço-base e do efeito da concorrência, não deixando, na generalidade dos casos, margem para acomodar os efeitos financeiros decorrente do período que estamos a atravessar. Se o DL 36/2022 vem permitir, nos procedimentos em curso, a adjudicação acima do preço-base, este mecanismo não funciona nos contratos já em curso, aos quais cabe, pois, atender de forma prioritária.