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especial alemanha | entrevista

“As empresas alemãs são clientes exigentes”

Miguel Leichsenring-Franco, presidente do Conselho Diretor da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã

Com um papel determinante no apoio às relações económico-comerciais entre Portugal e a Alemanha, a Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã (CCILA) está numa posição privilegiada para analisar o impacto da parceria entre os dois países. Miguel Leichsenring-Franco, presidente do Conselho Diretor da CCILA, aceitou o desafio e passou em revista alguns dos aspetos que caracterizam esta relação comercial bilateral.



Quantas são atualmente, em Portugal, as empresas de origem alemã e qual o volume de negócios que geram?

De acordo com os dados da Dun & Bradstreet de 2017, existem em Portugal cerca de 480 empresas alemãs das mais diversas dimensões. No seu conjunto, são responsáveis pela criação de cerca de 50 mil postos de trabalho direto, representam um volume de vendas e de serviços prestados superior a 12 mil milhões de euros e um volume de exportação total superior a cinco mil milhões de euros.

Entre as maiores exportadoras portuguesas estão todos os anos, invariavelmente, duas ou três empresas alemãs, com destaque para o Grupo Bosch, a Volkswagen Autoeuropa e o Grupo Continental.

De que setores de atividade são predominantes?

Durante muitos anos a presença alemã fazia-se sentir sobretudo no setor industrial. Atualmente, embora a indústria não tenha perdido importância, a presença alemã começa a apresentar maior relevância também noutras áreas, com particular destaque para as tecnologias de informação (TI) e, em menor escala, a agricultura ou o turismo. O Digital Delivery Hub, da Mercedes, ou o Centro de Desenvolvimento de Software da Volkswagen são alguns dos exemplos mais proeminentes na área das TI. Embora os investimentos no turismo e na agricultura não sejam tão significativos, posso referir os casos do Dinoparque da Lourinhã ou o projeto Gartenfrisch Jung, em Coruche, como exceções nessas mesmas áreas do turismo e da agricultura.

“O principal fator de atratividade do país são, de facto, os recursos humanos”

Quais são os fatores de atratividade de Portugal para os empresários alemães e quais as principais preocupações destes em relação à presença no nosso país?

Portugal possui numerosas qualidades, que tornam o país atraente para potenciais investidores: a situação política estável, a rede de infraestruturas viárias e digitais muito desenvolvida, a excelência dos recursos humanos, sobretudo nas áreas das engenharias e das TI. Como parte integrante da União Europeia, Portugal está sujeito às mesmas regras, cumpre os mesmos regulamentos que a Alemanha, além de estar geograficamente mais perto da Europa Central que outros países não europeus. Acresce ainda como vantagem a ligação que Portugal mantém com África e com a América do Sul.

A área que atualmente constitui o principal fator de atratividade do país é, de facto, os recursos humanos, sendo a formação profissional um fator-chave. Mas é também uma das áreas cuja evolução pode representar um motivo de preocupação para os empresários.

Em que aspeto?

À semelhança do que se assiste noutros países, Portugal enfrenta uma crise demográfica que, a médio prazo, poderá conduzir à falta de recursos humanos qualificados em número suficiente para responder às necessidades das empresas, uma realidade que já começa a ser um tema prioritário nalguns setores. A Câmara está atenta a esta realidade e tem alertado os responsáveis para uma maior adequação da formação profissional às necessidades e para a eventual requalificação de recursos excedentes em áreas onde a procura é menor.

Nos últimos anos, o país tem recebido vários investimentos em setores como as TI e a indústria, para os quais a disponibilidade de recursos humanos com uma qualificação de excelência é fundamental. E entenda-se que qualificação de excelência não se limita ao ensino superior.

É fundamental adaptar o conteúdo da formação em todos os níveis ao mundo empresarial, facilitando, por um lado, a integração do jovem na empresa e, por outro, indo ao encontro das exigências das organizações. Dois exemplos concretos demonstram a estreita ligação entre as instituições de formação e as empresas: a Universidade do Minho e a Bosch e a DUAL, o serviço de qualificação profissional da CCILA, e as empresas formadoras que recebem os formandos da formação inicial. Em ambos os casos, as instituições e as empresas colaboram na elaboração dos conteúdos a ministrar no âmbito da formação, para que os módulos de ensino sejam adequados aos requisitos e às necessidades para o desempenho das funções na empresa. A colaboração entre as instituições traduz-se, por sua vez, em elevadas taxas de empregabilidade, que, no caso da DUAL, se situam há muitos anos acima dos 90%.

Os conhecimentos linguísticos são outro aspeto muito valorizado pelos empresários que procuram Portugal. Em alguns setores específicos, como os shared service centres, os conhecimentos de alemão são fundamentais e os profissionais que os apresentam muito valorizados. Neste contexto, constatamos a necessidade de um maior investimento na aprendizagem de línguas além do inglês.

“A presença alemã começa a apresentar maior relevância também noutras áreas, com particular destaque para as tI e, em menor escala, a agricultura ou o turismo”

E no mercado alemão quais os setores mais interessantes para as empresas portuguesas serem bem-sucedidas e exportarem os seus produtos ou mesmo instalarem-se?

A Alemanha representa um mercado com vários milhões de consumidores com um elevado poder de compra, o que torna o país atraente a vários níveis. Para as empresas, sobretudo para as da indústria transformadora, tem um enorme potencial. É essencialmente nesta área que as organizações encontram o seu principal mercado: com uma economia que assenta predominantemente na indústria e na exportação de produtos industriais, a Alemanha requer uma ampla rede de fornecedores nacionais e internacionais que consigam assegurar o fornecimento de produtos de qualidade para integrar inúmeros produtos made in Germany.

Neste campo há já numerosos exemplos de sucesso de empresas portuguesas, algumas das quais começaram por fornecer as empresas alemãs em Portugal e depois, graças ao seu desempenho, foram selecionadas para fornecedores de grupos como a Bosch a nível mundial.

As firmas alemãs são clientes exigentes e para que uma relação comercial seja duradoura requerem fornecedores nos quais possam confiar, que garantam produtos de qualidade, dentro dos prazos estipulados, nas quantidades desejadas e de acordo com as especificidades acordadas. O compromisso com a qualidade e um fornecimento regular e atempado constituem fatores imprescindíveis nas relações comerciais com as empresas alemãs.

“As empresas alemãs são clientes exigentes e para que uma relação comercial seja duradoura estas requerem fornecedores nos quais possam confiar”

Esta onda de dinamismo a nível do empreendedorismo e inovação que se vive em Portugal está a ser alvo da atenção dos investidores/grupos económicos alemães?

Sim, os investidores alemães acompanharam a evolução favorável que a economia portuguesa viveu nos últimos anos e muitos já reconheceram as vantagens que o país lhes pode oferecer. Um caso emblemático é o do setor das TI: várias organizações alemãs, entre as quais marcas de renome mundial, assim como pequenas empresas desconhecidas do grande público, reconheceram as competências do país neste setor e no das engenharias e localizaram cá as suas atividades nestas áreas.

Neste contexto, a Câmara assinala um maior interesse por parte das empresas alemãs, muitas das quais procuram a nossa instituição como parceiro privilegiado para avançarem com investimentos em Portugal. As firmas alemãs que já se encontram no país há alguns anos há muito que têm consciência dessas vantagens e têm mantido um fluxo de investimento contínuo, por vezes durante décadas.

Como encara o futuro próximo das relações económicas bilaterais entre os dois países?

Depois de um período de relativa estagnação, justificado pela crise económica que se fez sentir a nível mundial, as relações bilaterais entre Portugal e a Alemanha voltaram a florescer nos últimos anos, não sendo alheia a esta situação a evolução positiva da economia portuguesa. A CCILA tem registado um interesse crescente por parte dos investidores alemães em conhecerem melhor o mercado e em darem os primeiros passos para assegurarem a sua presença no país. Mas também por parte das empresas nacionais temos verificado um interesse crescente no mercado alemão.

As organizações alemãs que já se encontram no país há mais tempo – algumas há várias décadas – continuam a investir em Portugal, nas suas fábricas e nos seus recursos humanos, e são atores fundamentais na economia portuguesa. Esta realidade deixa-nos otimistas em relação ao futuro das relações bilaterais e iremos continuar a trabalhar em prol do sucesso.